segunda-feira, 28 de novembro de 2011

pois a arte é a vida, mas num outro ritmo



você já teve orgasmo existencial?  estou tendo agora, múltiplos, lendo o livro “a elegância do ouriço”,de muriel barbery. a escolha das palavras, o estilo e os pensamentos, tanto da concièrge quanto da menina, nos seus diários de pensamentos profundos e captação dos movimentos do mundo, me fazem parar a leitura , fechar o livro e ficar plena e esvaziada, olhando para um ponto . nesse instante, não preciso de mais nada, entro em fusão com uma percepção que me abastece, completa e me devolve a mim mesma, sem questionamentos.

domingo à noite,estava lendo, lá fora no galpão. o silêncio do campo cortado de vez em quando por uma música escolhida pelo meu dj preferido, o meu marido, os gatos aninhados sobre a almofada macia da cadeira, cada um lambendo o outro e encontrando uma posição mais gostosa, ele trabalhando nos seus escritos, a porta do forno a lenha entreaberta com o resto de brasas do almoço. pensei ,depois de um tempo parada, como o livro no colo e o olhar perdido nos gatos: quantos orgasmos desses, existenciais, você já teve? vai,  liste, lembre-se agora: o primeiro que passou na minha mente foi quando, aos 11 anos, o professor de filosofia, falou sobre platão. tímida, criei coragem, tamanha foi a paixão que platão, exposto por ele, provocou em mim, que fui falar com o professor, fui atrás dele no corredor pedir que me indicasse mais coisas para ler sobre o filósofo. essa cena me levou a outra,aos 8 anos. a escola decidiu que teríamos aula de religião, eu fiquei animada, achei que conheceríamos todas as religiões. no dia em que teve início a primeira aula, o professor disse assim: quem aqui não é católico? quem não for católico não é obrigado a assistir, não será cobrada falta. pensei,numa fração de segundo, que se essa aula fosse enriquecedora para todos,se acrescentasse algo à vida de alguém, ele não proporia isso. senti  que tudo o que ele ensinaria não somaria...e já que ele propunha a exclusão, me retirei. fui criada numa família ortodoxa, sem fanatismos. ninguém mais saiu da sala, só eu.ainda olhei para as minhas duas amigas judias mas elas ficaram. fazia muito frio e fui para o pátio do colégio, àquela hora vazio. sentei num banco absorvendo aquele silêncio,o imenso espaço sem criança nenhuma, todos em  aula, e senti um grande prazer, um grande orgulho de mim mesma, foi um orgasmo sim, um imenso prazer que proporcionei a mim mesma. mantive essa coerência e nunca mais voltei aquela aula. depois lembrei de quando, aos 20 anos fui na tate gallery em londres e entrei numa sala, em que só havia um desenho grande de da vinci, jesus e madona. um desenho imenso, em pastel,em tons de azul e sépia,todo feito em  linhas. a sala em meia penumbra e uma luz delicada se esparramando pelo desenho. sentei-me numa cadeira que havia diante da obra e não vi a hora passar, o guarda teve que me avisar que a galeria iria fechar. enquanto estive ali, ninguém entrou. saí fora de mim, estive ali e em outro  lugar ao mesmo tempo, com leonardo.

 ah, a menina, descrevendo as árvores no livro, me levou ao primeiro passeio com a minha filha, com um mês de vida, no parque lage, no rio de janeiro. meu pai estava lá para captar com sua máquina fotográfica o seu primeiro olhar: para uma gigantesca árvore.com o carrinho parado sob aquela copa, mergulhei naquele olhar que via pela primeira vez uma forma, que para ela, ainda não tinha nem nome. e fui para um lugar , junto com o olhar dela : atravessei um portal em que eu, ela, a árvore, o parque lage, a cidade, tudo estava integrado em mim e eu em tudo, agora com ela, com o deslumbramento da primeira vez e minha maternidade calma. essa lembrança me levou ao dia em que dei à luz, parto normal, e, ao contrário do que imaginava, não chorei. nem ela, minha bebê. nos olhamos profundamente, o cordão umbilical ainda pulsava sobre o meu corpo e fiz uma imensa declaração de amor e de boas-vindas a este mundo e à nossa relação. tudo desapareceu à nossa volta, só ficamos eu e ela. quem chorou foi o médico, seus  assistentes, a enfermeira...quando voltei para a sala, vi  que todos estavam emocionados e perguntei : tudo bem? ela não chorou?! tudo bem, ela é uma menina elegante, alma chique, respondeu o médico. 
gostei de relembrar alguns orgasmos existenciais, vou listar outros. ah, tem também o jorge donn dançando a coreografia de maurice béjart para o bolero de ravel, hoje mesmo lembrei do bailarino argentino e em memória dele,com a energia dele no palco gravada em mim, inventei uma coreografia para o pássaro de fogo. ah, sou muito camélia sobre o musgo (nem sempre, como ela também percebe). copio aqui a expressão da concièrge, entre no wabimauaaah (clique aqui) para ler sobre "camélia no musgo".

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

telefonia interior



chove, chove, chove fino, chove grosso, chove uma poeirinha microscópica que a gente só vê nos raminhos da grama molhada, cheia de pingos que não evaporaram ainda.uma semana sem ver o céu azul, sem  sentir o calor do sol sobre o corpo, sem pegar a toalha que seca e se perfuma rápido no varal.de vez muito em quando uma estrela aparece e logo some, só para confirmar que ainda está ali... lembrei daquela amiga que, no final da faculdade, foi morar em paris. e lá vivenciou seis meses de dias e noites nublados. e , muitas vezes, em desespero, chegou a ligar para um número que atendia pessoas à beira do suicídio. ela encontrou muita gente linda, fez grandes e eternos amigos por lá, trabalhava no que ama, com paixão e reconhecimento por seu talento, conheceu e amou aquele que seria o pai da sua futura filha... mas o sol, o sol fazia muita muita falta. uma noite quase pediu uma ambulância mas não o fez, se controlou. nós nos correspondíamos muito. ela guardou todas as nossas cartas e prometeu que faria um livro de presente pra mim. não fez. sumimos uma da vida da outra nem sei dizer por que, muito tempo depois de sua volta da frança, do marido que veio de lá, da separação deles,  de novos amores e despedidas.eu a vi no facebook outro dia , só tem a foto dela, mais nada.já fazem três dias que a internet sai do ar aqui no campo, em que celular não pega e não tem telefone fixo. descobrimos que a torre que capta o sinal é movida à energia solar, ela não acumula a energia do sol mais do que sete dias. vão trocar por outra, que acumula por mais tempo. chuva tão seguido  não é comum por aqui. já foi encomendada essa outra placa solar, vai chegar lá do amazonas. bem, pelo menos agora tem uma explicação. tem?  muito chato ver a tela em branco, a rodinha azul girando, a esperança de ver the saint google a cores e aparecer aquele monte de letras escuras, não foi possível fazer a conexão, verifique isso ou aquilo...afff. meu sol ainda resiste.
na penúltima lua cheia, sentei-me com o meu marido naquela mesa que inventei com fogo ardendo no meio e mandei mil recados, direto pro universo,entre uma e outra taça de vinho e sem intermediários.um deles era que eu queria reencontrar  a minha prima, sumida depois que voltou a belgrado, há muitos anos sem notícia alguma, nem facebook, nem google, nem nada que me ajudasse a reencontrá-la. e nessa noite fui bem firme...e não é que ela reapareceu no dia do meu aniversário, o tal 11.11.11 e ainda me deu parabéns em sérvio? e ainda conversando em português, que ela não esqueceu desde que foi embora daqui? foi demais pra mim, para a minha telefonia interior. ela, assim como eu, se recusou a aderir ao facebook por um bom tempo mas não resistiu e, assim que entrou, me reencontrou.na noite daquela lua cheia, ainda pensei na irmã dela, com quem tive menos convivência, que se casou com o professor de música e virou cantora de ópera na alemanha. e não é que a minha prima combinou de nos vermos todas e falarmos neste sábado, todas, a cantora inclusive? mas a placa solar,instalada no alto da montanha,  não conseguiu acumular mais energia pra sobreviver a mais de sete dias... e aqui estou, conversando com calma ( mais ou menos...)
com o coração a mil, enviando toda essa comprovação do amor que não perde o link, não sai do ar, não se esvai por aí. ;)
mas eu prefiro tudo isso com a tecnologia funcionando a favor. J

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

beladonas ou o que preciso dizer agora




" ninguém deve se permitir viver sob o domínio do medo e portanto aceitar qualquer coisa." 
esta é a essência da minha particular declaração universal dos direitos humanos. 
cultura e educação ajudam a preencher os buracos negros de cada um. ter uma visão lúcida sobre do que se trata esta vida, viver neste planeta azul dançando no cosmos, sem cair, também.
 sentimento de eterna insatisfação é a droga mais nociva. achar sempre que haverá um outro para resolver uma questão que cabe a você também.
lembrei daquela mulher bonita, loura exuberante que trabalhou na minha casa. ela morava numa dessas favelas famosas, ponto turístico. o marido porteiro nem sempre podia dormir em casa. e ela era hiper ciumenta e vivia achando que tal ou tal mulherzinha estava de caso com ele. ela recorria aos chefões do tráfico que mandavam dar surras nas prováveis amantes dele. ela me ouvia falar sobre o poder dentro de si, a purificação dos sentidos e tantos outros recursos pacíficos, gratuitos e sempre disponíveis dentro de nós... só ouvia. 
beladonas, as flores que trazem em si o remédio para dores e , conforme a dose, a morte por envenenamento.dá para transformar o veneno em remédio, é possível, quem não sabe disso?
mudar fora e dentro é mais que urgente.mudar a visão sobre tudo.o grande começa no pequeno. lembrei daquele analista comentando que  uma pessoa que traz muitos problemas para sua família é como a lata de lixo da família, aponta para o que a família precisa transformar. eu era muito jovem quando ouvi isso pela primeira vez. pensei literalmente numa lata de lixo, que se investigarmos o que foi consumido ali ,poderemos traçar a imagem daquele grupo todo. 
é isso o que precisava dizer agora.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

a minha luxúria é o que eu sinto, penso, percebo, vivo


assim que cheguei aqui no campo, este ano, não quis ler nada. eu amo ler mas estava precisando ler nada, precisava que os meus pés descalços lessem o chão, meu corpo lesse o sol, precisava decifrar o som do vento, dos pássaros, grilos, das partituras de tambores dos sapos lá longe anunciando a chegada da chuva, do crepitar da lenha no fogo, nossa, como tem palavras a madeira se desfazendo na chama,o rio desviando das pedras  e sussurrando em allegretto, essa era toda a escrita que o meu corpo e espírito precisavam. e foi o que fiz. depois chegaram os amigos,  trouxeram autores contemporâneos enquanto eu relia clássicos que tem aqui. fui para a china, israel, minas, colômbia,japão, new york,índia, tantos lugares... enquanto o meu marido revisava o seu próximo livro, um vazio no coração do mundo,um romance baseado em fatos reais da recente história brasileira, que será lançado em breve.
eu gosto também de observar a intimidade das flores, elas me passam uma sensualidade natural e vibrante. uma amiga minha me perguntou certa vez porque eu não escrevia sobre sexo. diante de um mundo em que proliferam farmácias, pet e sex shops, programas na tv, cursos pra ensinar as pessoas a descobrir o ponto g... falar sobre sexo? pra que? que cada um se encontre e se entenda na intimidade da sua vida. ela me emprestou o livro a vida sexual de catherine millet, disse que não tinha conseguido ler até o fim, que foi um sucesso na europa, queria saber o que acho. estou quase no final do livro, porque quando pego um assunto vou até o fim. li como quem lê uma lista de supermercado, nunca conheci uma mulher tão angustiada e com tão baixa auto-estima. e fria. até agora me pergunto para que ela escreveu e publicou essa obra, não consigo entender. libertina? hahaha. libertina que se preze é a personagem do casa dos budas ditosos,do joão ubaldo, esta sim, já bem madura ainda fez a caridade, entre quatro paredes, de ensinar os homens a não terem mais ejaculação precoce.
pro meu gosto existem farmácias demais, sex shops demais, pet shops demais. e cachorro saudável, com dono saudável, precisa de lacinho, perfume, esmalte de unhas? minha filha fez uma pesquisa sobre pets para a empresa de geração de conteúdo para tv , em que trabalha, e descobriu que já tem até motel para cachorros, existem os que acreditam que cachorro estressado tem que fazer sexo. não faço parte desse mundo de crenças. não acho que sexo faça parte dos medicamentos contra estresse, depressão, tristeza aguda.
conhecer o próprio corpo  e o corpo do outro é uma viagem que depende da qualidade, da sensibilidade do viajante. simples assim. nunca gostei de excursões ou conhecer dez países em 15 dias . também acho uma pobreza os que só gostam  do trivial arroz com feijão. que não se abrem a novos sabores.
a minha luxúria é o que eu sinto e o que eu sinto é o que eu penso,percebo, vivo. ponto.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

oh, meus ventos perfumados... respondam !



ai minha acqua vitae, meu sol, meu céu e nuvens, meus lenços indianos, 
meu vento quente, macio e perfumado com sândalo que vem lá de bangalore,
 com mato, musgos e grama recém regada pela chuva,
 me respondam : 
quanto tempo leva para a humanidade descobrir que pensar só em si não leva a nada... assim como pensar só nos outros é apenas suplício?
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