sexta-feira, 4 de setembro de 2009

certidão de independência

divagações sobre certidão feminina de independência...
home is where your heart is é o que está escrito naquela bandeja de madeira na cozinha, comprada antes mesmo do início das fundações da nossa casa.lar é lugar de origem.tenho pensado sobre isso.meu coração está em muitos lugares.tenho muitos lugares de origem.meus pais,buenos aires, iugoslávia, itália,rio de janeiro,paraty,interior de minas, tóquio, machu picchu,tantas pessoas que me fizeram ver com clareza meu lugar de origem que nem cabe aqui.meu coração consegue estar em vários lugares e ser fiel.. a grande matéria prima da minha independência e autonomia foi a convivência com os meus pais.todas as conquistas e sofrimentos que vivi ao lado deles só me ajudaram a ser mais, me descobrir mais humana e independente, foi mais que faculdade, mestrado, um grande laboratório prático.com eles aprendi o profundo significado de dar satisfação, o que me levou a construir relações de profundo e rico significado.não existe autonomia sem envolvimento.
meu pai era também um homem do mar e profundo conhecedor da natureza. desde pequena ele me ensinou a furar ondas gigantescas,vencer o medo, ir lá no fundo, onde ela não arrebentaria a minha cabeça, onde estava tudo tranquilo, e a não perder a cabeça com o que é mais forte, como a natureza, a ter respeito e não perder o controle por medo ou ousadia estúpida. ele dizia sempre que se eu pegasse uma forte correnteza para não me debater e desesperar, para respirar, boiar acima da correnteza e confiar que ela mesma iria me devolver à terra firme.quando meu marido era meu namorado e dormia em casa, o vizinho do interior disse para o meu pai que o meu namorado jamais iria me valorizar pois já tinha tudo, inteligência, sexo, carinho... ao que meu pai respondeu: se ele acha que já tem tudo e não a valorizar ele não é homem para ela.antes de morrer, ele olhou bem para mim e disse o que eu nunca vou esquecer: parabéns, você encontrou a sua própria luz.hoje eu me lembrei disso. voltei ao lar que ele me ajudou a construir. outro dia voltou a voz da minha mãe me deixando chateada ao insistir que eu era o tipo de mulher que não teria a menor chance de ser feliz longe do que é raro e belo.acabei compreendendo.no começo eu recebia isso como uma ofensa, como se ela estivesse me julgando fraca.era exatamente o contrário.
peguei um livro (um dos que mais amo)que uma amiga-lar me deu há anos:uma das características principais do século 20 é ser lembrado como a época em que começamos a compreender qual era o nosso endereço. a bola enorme, linda, azul e molhada é apenas uma das maneiras recentes de descrevê-lo, fala diane ackerman...conhecer o nosso endereço pode não terminar todas as guerras mas enriquecerá nosso sentido de encantamento e orgulho. fará com que lembremos que o contexto humano não é apertado como um nó, mas que é grande como o universo que temos o privilégio de habitar. conhecer o nosso endereço.o grande começa no pequeno, pensei.a relação com o mundo começa em casa.não é o que a gente recebe, é o que a gente faz com o que recebe.como tudo.o tempo todo.começa em casa.

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