quarta-feira, 12 de agosto de 2009
acordos rodrigueanos 2009
ela é gay. faz psicanálise há mais de quinze anos. ele é gay e não faz psicanálise porque ela não paga. são casados e tem filhos adultos.quando estão juntos fumam todos um baseado.esse é o acordo.ela foi molestada pelo padrasto na adolescência e fugiu de casa. agora o marido controla o crescimento dos pelos pubianos da filha.quando estão juntos admiram o novo celular trocado por pontos.esse é o acordo.ele apresenta as amiguinhas para o amigo coroa-com-corpinho-de-vinte que não consegue trepar se não for agenciado.ela trocou a compulsão que tinha por shopping por exercícios na academia e sexo para quem precisa, e entra sorrindo no carro do coroa. esse é o acordo.ela passa o dia reconhecendo firmas e esperando aumento de salário e acredita que seu trabalho presta serviços à sociedade (até o governo já tentou cancelar esse tipo de prestação inútil mas a corrupção impediu).agradece a deus por ter conseguido financiar o imóvel que , se não era o desejado, pelo menos um dia será seu, assim,quem sabe, como o marido. esse é o acordo.ela se cura da síndrome de pânico e abaixa a cabeça para qualquer ordem que venha acima dela, nem questiona o sentido, só para não sentir mais nenhum medo de novo.esse é o acordo.ele é um senhor solitário, a mãe mudou para longe, faz sempre tudo igual, repete sempre as mesmas tarefas do mesmo jeito e sempre olha aflito para o relógio para nunca ultrapassar a hora.se algo novo ameaça entrar no espaço dele, controla o seu ímpeto violento com sorrisos de delicado sarcasmo e sai rápido pois tudo tem que ter hora marcada.tem seguidores que seguem o seu exemplo e essa influência lhe basta. esse é o acordo.ela veio para a cidade grande, entrou para a faculdade e acredita que entende tudo sobre realização, libertação e felicidade. diz que não tem nada para aprender nesta vida,não perde uma chance de falar mal de todo mundo, acredita que só nasceu para ensinar aos outros como seguir o caminho dela. esse é o acordo.ela trabalha com animais e trata a todos como se vivesse o dia inteiro dentro de uma pet shop, fala sempre daquele jeito manso tatibitate.não percebe a diferença entre um golden retriever que está triste e um poodle que vive irado,latindo agudo e mordendo todo mundo.seu coração sempre escolhe o poodle, acha que ele é um fofo.seus olhos brilham raramente, a última vez foi quando pegou emprestado um colarzinho novo com o poodle,não,com a moça que acabara de conhecer. conseguiu um namorado. esse é o acordo.ela vivia indignada e revoltada com a moça que manipulava o grupo de estudo e namorava uma brilhante psicótica, cuja especialidade era plantar intrigas entre todos.a brilhante psicótica sumiu e ela está feliz pois agora ela é a namorada. esse é o acordo.ele saiu finalmente da casa da mãe, para um outro bairro,descobriu a vista para a favela perto do mar e não gostou. quer voltar para o bairro da mamãe ou qualquer coisa parecida que lembre o cheiro da fralda. essa é a sua principal meta, fazer o caminho de volta à infância que há muito se foi.culpa a crise econômica internacional pela demora do retorno.os amigos de infância não lhe emprestam mais nem os ouvidos, a última que ainda acreditava que poderiam ser amigos,tentou, queria ajudar.via internet,respondeu ao chamado dele.recebeu de volta um balde de cocô que fez com que ela desligasse triste o computador.ficou o cheiro de podre, de produto vencido no ar, o que ele é muito hábil em criar.esse é o acordo.chove na cidade. as ruas estão inundadas.no dia seguinte à ressaca, a praia está cheia de anéis de camisinhas, canudinhos,sacos, copinhos,garrafinhas brancas,azuis e verdes,tampinhas plásticas de rosca e pés avulsos de chinelos de borracha.os garis varrem a areia, recolhem tudo e depois fazem a coleta seletiva do que vai para reciclagem.esse é o acordo.
- é o senhor que tece o (in)evitável? – alguém fala no calçadão.
- é o senhor que tece o (in)evitável? – alguém fala no calçadão.
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