terça-feira, 9 de novembro de 2010

escutar o ventre


um dia ele me contou que os povos muito racionais apontam a própria testa quando dizem eu, os emocionais apontam o coração e alguns, raros e escondidos neste planeta, fiéis  a uma ancestralidade ricamente humana, apontam o ventre para mostrar onde o eu habita.agora que eu e o livro o corpo e seus símbolos - uma antropologia essencial ( de jean-yves leloup) nos encontramos, fiquei sabendo o seguinte: ter ventre é ter centro. nas esculturas romanas, o cristo tem um ventre bem proeminente, o mesmo acontece com as esculturas das virgens romanas. buda e lao-tsé são representados às vezes com um grande ventre.isto não quer dizer que eles sejam grandes apreciadores de favas ou massas e sim que estão centrados no universo.se vocês observarem um bebê verão que ele corre com seus pés e com seu ventre porque o ventre é o centro da gravidade. assim, o ventre é um local sagrado. na arte japonesa do ikebana, um arrajno feito com o ventre é muito diferente de um arranjo feito com o coração. um arranjo feito com o coração manifesta nossos sentimentos ou nossa emoção e um arranjo feito com o ventre manifesta a harmonia da natureza. arte das formas é como um eco das formas que se encontram na natureza. no japão, servir o chá é uma arte. o chá pode ser servido com o ventre.quer dizer, a pessoa oferece o chá permanecendo centrada. e ocorre uma comunicação de energia. lembrei de quando meu pai estava indo embora, os médicos tinham proibido qualquer alimento sólido. uma noite ele me pediu para fazer uma sopa de legumes, em pedaços. e eu fiz, uma sopa muito rica. e ele amou. e, ao contrário do previsto, passou muito bem.ele, que tinha uma mente super científica, comentou que devia ser a energia com que fiz aquela sopa. acho que a fiz com o meu ventre.penso agora nas danças de roda que a djalla nos propõe, estou de volta aquela sala imensa, no meio do mato e das rochas em que consagramos a primavera, numa união mais que possível, verdadeira.acho que naquele dia, todos, mulheres,homens e crianças estavam com o eu do ventre aceso. enquanto escrevo, percebi mil coisas sobre a nossa sociedade contemporânea e sua estética do corpo - e as consequências disso nas relações consigo mesmo e com os outros.não aprecio ventres imensos,gosto das curvas do meu,o que aprecio mesmo é  a arquitetura espontânea e natural do corpo de cada um, sempre observo o conjunto.o autor do livro pede que escutemos o nosso ventre."ele é duro ou mole? sentir se o ventre está duro. se ele se fecha, ele se defende. ou, ao contrário, se ele é mole." compreendo.

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